Intuição infantil?
O meu filho é um miúdo meigo e ternurento, mas ontem estava um pouco mais doce ainda que o normal.
Portou-se lindamente, desde o momento em que o fui buscar à creche até ao final da noite. Foi um daqueles dias 5 estrelas.
Não fez birra no supermercado, e deixou-me fazer compras à vontade.
Não chorou para sair do corredor dos brinquedos.
Chegando a casa tomou banho alegremente e comeu o seu jantar sem grandes fitas. A cozinha ficou (quase) limpa.
Depois do jantar pediu-me várias vezes que brincasse com ele. Apesar de sentir algumas dores, aceitei.
Estivemos bastante tempo sentados no tapete a brincar aos "acidentes" e "tinonis" com os carrinhos e as pistas de automóveis.
No fim, fez chichi no pote, lavou os dentes e bebeu o leitinho.
Deitou-se no chão da sala e preparou-se para dormir. Deitei-me ao pé dele e apaguei a luz.
Fiquei a pensar se aquele não seria o último dia dele como filho único.
E ao mesmo tempo que pensei isto, com impulso agarrei-lhe a mão de mansinho.
Como se de repente pressentisse o mesmo, o meu filho abraçou-me e fez-me festinhas no rosto com uma doçura maior que costume.
Quando o senti adormecer, tentei levantar-me, mas logo desisti quando ouvi um "não vás, mamã".
Fiquei mais tempo, até o sentir verdadeiramente a dormir, sempre a fazer-lhe miminhos.
Abandonei a sala com o coração cheio de mel.
Antes de virar para o corredor em direção ao quarto, olhei de relance para o meu filho.
Dormia tranquilamente com ar satisfeito.
Meia hora depois, o pai foi busca-lo para o levar para a sua verdadeira caminha no quarto. É este o nosso ritual.
Foi ali.
Foi ontem.
Naquele gigantesco abraço.
Foi naquele momento que (não tenho dúvidas) fizemos a nossa despedida de "filho único".
Um momento só nosso e muito, muito especial.
O fim da nossa família como ela era. E o princípio de algo novo e diferente.
Não sei se o parto é hoje, não sei se é amanhã, se é depois. Mas agora sei, graças ao meu filho... que está para muito, muito breve.
Chamem-me louca, mas acredito que o meu filho previu que o "momento" está próximo.
E quis ter-me só para ele mais um tempinho.
Daí o portar-se bem.
Daí a tamanha sofreguidão por mimos e abraços.
Talvez ele ainda não saiba que o amor de mãe não se esgota, nem se divide.
Multiplica-se.
Mas vai saber em breve.